O acordo de cessar-fogo de Gaza, assinado pelo Presidente Donald Trump no Egito em Outubro de 2025, estabeleceu uma trégua frágil e que foi praticamente imposta, não natural. Durante a assinatura do plano de paz, que não contou com a presença nem de Netanyahu e nem de nenhum representante do Hamas, o plano dependeu da mediação externa de países como Egito, Catar e Turquia. A falta de consenso direto entre os combatentes levanta dúvidas imediatas sobre a durabilidade da paz, que depende quase inteiramente de robustas garantias e fiscalização de outros países.

A primeira evidência dessa fragilidade foi evidenciada ontem mesmo, após assinatura do tratado, com a realização de ações militares israelenses no terreno. Durante o reposicionamento tático para a “Linha Amarela” de segurança, soldados de Israel lançaram uma campanha de incêndio (arson spree) em Gaza, queimando casas, suprimentos de alimentos e destruindo a Estação de Tratamento de Esgoto Sheikh Ajlin. Tais atos de destruição de infraestrutura vital, que comprometem a habitabilidade do território e a sobrevivência da população, são considerados por algumas organizações como evidência de crimes de guerra e minam o objetivo humanitário do acordo. Por outro lado, o governo israelense considera isso como sendo uma tática de fragilização do Hamas, impedindo um ressurgimento rápido do grupo terrorista.
Do lado do Hamas, o grupo rejeitou a exigência de desocupar o governo de Gaza e se desarmar, mesmo esses itens sendo exigências para se firmar o acordo de paz. O grupo reafirmou que o desarmamento está “fora de questão”. Em vez de se retirar, combatentes remanescentes do Hamas voltaram às ruas para reafirmar o controle e realizar execuções sumárias contra palestinos acusados de colaboração com Israel. Essa violência intrapalestina tem o efeito estratégico de eliminar qualquer base de apoio a um futuro governo palestino alternativo e, segundo analistas, aumenta o risco de uma guerra civil interna, obscurecendo a transição de governança prevista no plano. Arrisco dizer que não haverá governo alternativo na Faixa de Gaza.
A primeira fase do acordo foi concluída com a libertação dos últimos 20 reféns israelenses vivos em troca da soltura de cerca de 2.000 prisioneiros palestinos, sendo que uma parte deles já estava condenado à morte pela justiça israelense. Contudo, o Hamas não entregou os restos mortais de pelo menos 23 reféns falecidos, utilizando-os como um ativo de negociação. Essa tática de má-fé, juntamente com o alto custo pago por Israel, mantém o trauma das famílias e fornece a Israel um pretexto legal e político para o rompimento do cessar-fogo, caso a pressão interna aumente.

O clima de tensão militar permanece extremamente elevado na região. A retirada das tropas israelenses para a “Linha Amarela” é tática e parcial, deixando as forças de defesa de Israel com o controle de uma fatia significativa, cerca de 50%, da Faixa de Gaza. Israel deixou claro que responderá a qualquer “ação ameaçadora”, o que sugere que incidentes de segurança residual, como ataques de drones, podem rapidamente reacender o conflito total. A Faixa de Gaza, já descrita como inabitável, está agora sob vigilância mútua ao longo da faixa de segurança, onde quem continua a sofrer é a população civil inocente.
Em suma, a paz em Gaza é menos um acordo de conciliação e mais uma suspensão forçada da violência. Sua sustentabilidade depende inteiramente do Ponto 15 do plano Trump, que exige a implantação imediata de uma Força Internacional de Estabilização (ISF) para garantir a segurança e o desarmamento. A ausência de um anúncio público decisivo sobre a materialização e a logística dessa força, que deve ser composta primariamente por soldados árabes, significa que o vácuo de segurança será preenchido pelo Hamas, tornando o desarmamento uma quimera e mantendo a perspectiva de que a guerra só pode ser considerada suspensa, mas não encerrada.
